Que Time é Esse: Schalke 04
Que Time é Esse: Schalke 04
“O regime de Hitler foi mestre em explorar o potencial do futebol, como divulgador da imagem do movimento nazista. As estrelas dos times alemães passaram a se tornar verdadeiros garotos-propaganda da idéia da supremacia ariana” – Roger Moorhouse.
Recentemente com a classificação do Schalke 04 para a Liga dos Campeões e agora com a surpreendente vitória esmagadora e imponente sobre a atual campeã da Liga a Inter de Milão, esse time que até então não era um dos mais populares em terras brasileiras ganhou algum destaque na mídia, nada especializada, nacional. Porém o que poucos sabem é que esse tão tradicional time alemão é repleto de histórias para lá de curiosas! Time de jogadores mineiros, time que se aproximou do regime nazista, time do maior escândalo no futebol alemão e de grandes jogadores como Kuzorra, Szepan, Klaus Fischer, Olaf Thon, Gerald Asamoah, Sand, Neuer, Raúl, Farfán, Wilmots e tantos outros!
Sediado na cidade de Gelsenkirchen, Alemanha, e fundado no dia 04 de maio de 1904 por garotos entre 14 a 16 anos (originalmente o time se chamou Westfalia Schalke), o Schalke no passado teve muitos de seus jogadores trabalhando nas minas locais, numa cidade em que esta atividade econômica foi muito importante e fundamental no seu desenvolvimento. A relação do clube com os mineiros é tão grande que um dos apelidos da equipe é “Die Knappen”, ou “mineiros”. Até os dias atuais em começo de suas temporadas o clube, para criar um vínculo entre os jogadores faz uma excursão até o interior dessas minas que antigamente os jogadores do clube trabalhavam. Muitos creditam que um dos principais fatores da popularidade do Schalke 04 na Alemanha (mesmo com períodos de grandes vazios em relação a títulos importantes) é sua forte ligação com as classes operárias. Porém não se pode negar que o final da década de 30 e o começo da década de 40 foi talvez um marco na história desse clube em tempos de exposição.
“Na Itália redigia-se o Manifesto da Raça,começavam os atentados anti-semitas, a Alemanha ocupava a Áustria, Hitler se dedicava a caçar judeus e devorar territórios. O governo inglês ensinava os cidadãos a defender-se dos gases asfixiantes e mandava estocar alimentos. Franco encurralava os últimos bastiões da República Espanhola e o Vaticano reconhecia seu governo. César Vallejo morria em Paris, talvez debaixo de aguaceiro, enquanto Sartre publicava A Náusea. E ali, em Paris onde Picasso exibia sua Guernica denunciando o tempo da infâmia, inaugurava-se o terceiro campeonato mundial de futebol, sob a sombra ameaçadora da guerra que chegava. (...)” – Eduardo Galeano, Futebol ao sol e à Sombra.
A política de pão e circo romana passou de mãos em mãos ditatoriais durante séculos como forma de acalmar tensões populares e se legitimar no poder... E evidente que a festa pagã do futebol não escaparia das garras dos donos do poder. Ditaduras militares como no Brasil e Argentina, Governos Telecráticos como o de Berlusconi na Itália, usaram times populares para seus fins políticos ou mesmo sediaram Copas do Mundo (um gigantesco rabo preso da FIFA). Porém voltando ao Schalke, sua forte ligação com o perfil de “alemão trabalhador e vencedor”, graças aos mineiros e operários que o fundaram, fazia deste time o time ideal para os planos da política nazista.
“Também para os nazistas, o futebol era uma questão de Estado. Um monumento lembra na, Ucrânia, os jogadores do Dínamo de Kiev de 1942. Em plena ocupação alemã eles cometeram a loucura de derrotar uma seleção de Hitler no Estádio Local. Tinham sido avisados:
- Se ganharem, morrem.
Entraram resignados a perder. tremendo de medo e fome, mas não agüentaram a vontade de ser dignos. Os onze foram fuzilados vestidos com as camisas, no alto de um barranco, quando terminou a partida.” – Eduardo Galeano, Futebol ao sol e à Sombra.
Essa triste passagem na história do tradicional Dinamo de Kiev ilustra como o futebol foi uma dos grandes carros-chefes da propaganda nazista, e dentro do espírito ariano que os nazistas buscavam o time de jovens mineiros e operários seria o time ideal para levar essa propaganda a seu esplendor.
O Schalke 04 foi hegemônico no Campeonato Alemão na década de 1930 e início da década de 1940. Foram seis títulos (1934, 1935, 1937, 1939, 1940 e 1942), na Copa da Alemanha 1938, DFB-Pokal (semelhante a nossa copa do Brasil atual) em 1937, Gauliga Westfalen ( torneio criado em 1933 e que teve a última edição em 1945 com o desmembramento da Alemanha Nazista com times da região da Vestafália, semelhante ao nossos torneios regionais) 1934, 1935, 1936, 1937, 1938, 1939, 1940, 1941, 1942, 1943, 1944.
Uma das mais memoráveis partidas da década de 40 ocorreu em 22 de Junho de 1941, entendam o porquê:
“22 de Junho de 1941. Esta é uma das mais importantes datas da história moderna. Ainda raiava o sol, quando, bem no início da manhã, a Alemanha nazista cruzou as fronteiras da União Soviética, lançando guerra contra o território vermelho.(...)
Naquele domingo de junho, no ano de 1941, Berlim acordou com a notícia de que as tropas nazistas haviam invadido o território de Stalin, mas aquele não seria, para o povo alemão, o episódio mais importante do dia. Estava programada para acontecer naquela tarde, no Estado Olímpico da cidade, a final de um importante torneio de futebol.
Lá, os campeões do Schalke 04, clube favorito dos adeptos do regime nazista, iria enfrentar o Rapid Viena, time que defendia a Áustria, país recentemente anexado à Alemanha.(...)” – Roger Moorhouse.
O Schalke fez uma partida memorável, porém o Rapid Viena se consolidou campeão com uma vitória que silenciou o Estádio Olímpico, 4 a 3, diante dos olhares do Füher. O lendário atacante austríaco Franz Bider (um dos poucos jogadores a marcar mais de mil gols) marcou 3 dos 4 gols do Rapid.
O período nebuloso na história do time em questões políticas passou. Hoje o Schalke é um time forte, organizado e que tem em seu time jogadores do Japão, Peru, Irã, Brasil, China e Gana que complementam um time com estrelas do futebol alemão como o jovem goleiro Neuer (que em minha humilde opinião é um dos 5 melhores goleiros que vi jogar).
Também é importante lembrar foi através do Schalke 04 que o ganês Gerald Asamoah se tornou o primeiro negro a jogar pela seleção alemão, em 2001.
Com mais de 61 mil pessoas na Arena AufSchalke todo fim de semana, é do Schalke a maior taxa de ocupação do Campeonato Alemão: impressionantes 99,8%. Para o confronto contra o Manchester United, no dia 26 de abril, os 54 mil ingressos colocados à venda se esgotaram em apenas duas horas.
Boa sorte ao Schalke e que esse início de século seja marcado ao clube como um século de conquista e glórias pelo time da integração e que sabe agregar povos, culturas e que sabe formar uma equipe forte, que nos remetam aos tempos onde os meninos humildes das mais diversas periferias do mundo, das mais diversas etnias derrotem o homem antropocêntrico grego e a burguesia em seu jogo pelo aburguesamento do futebol que nas palavras o marxista italiano Antonio Gramsci é “um reino de lealdade humana exercida ao ar livre”.
Força Schalke!
Por Fábio Alexandre Tardelli Filho.
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